“Legislação leve” e “coragem para delegar” essenciais perante o “medo” da Inteligência Artificial 428

O Centro de Congressos do Lagoas Park, em Oeiras, recebe a 6 de junho o Rethinking Pharma 2024, este ano com o mote “Fast Forward”. A reunião magna dos profissionais da indústria farmacêutica é um main event onde se encontram colegas, afinam-se parcerias, e se reflete sobre novas soluções e caminhos para o negócio farmacêutico. O programa está disponível no site do evento, mas pode clicar aqui e garantir a sua presença na iniciativa que resulta de uma parceria da Pharmaplanet com a Marketing Farmacêutico.

Um dos keynote speakers será Ricardo Baptista Leite, médico português que já foi deputado durante quatro mandatos na Assembleia da República e atualmente CEO da HealthAI – Global Agency for Responsible AI in Health, uma organização sem fundos lucrativos que visa expandir a capacidade dos países em todo o globo a regular a inteligência artificial (IA) na Saúde. É ainda presidente e fundador da UNITE, uma rede de parlamentares focada na Saúde global com mais de 300 membros em quase 100 países.

Sem surpresa, a temática em torno da presença de Ricardo Baptista Leite no Rethinking Pharma é “IA e os Novos Ecossistemas da Saúde”.

Com o AI Act, regulamento aprovado pelo Parlamento Europeu para definir o uso de inteligência artificial na União Europeia, a ser aprovado há relativamente pouco tempo, importava perguntar a Ricardo Baptista Leite, que concedeu uma entrevista ao Netfarma, sobre a viabilidade do quadro regulamentar aprovado. “Os desafios da regulamentação da IA têm surgido, normalmente, porque há uma preocupação de várias entidades, sejam elas governamentais ou regulamentares, que neste momento temem os potenciais efeitos negativos na sociedade, pessoas e instituições”, começou por dizer.

Reserve aqui o seu lugar no Rethinking Pharma.

Inscrição Individual – 295€ (IVA incluído) | Inscrição de Grupo (10 pax) – 2.655€ (IVA incluído)

O valor inclui: Welcome Kit, acesso a todas as sessões e debates, pequeno-almoço, coffee-Breaks, almoço (entrada, prato principal, sobremesa e bebidas) e Business Lounge.

Acompanhe tudo no site oficial: rethinkingpharma.pt

Explicou depois que a HealthAI fez recentemente um inquérito junto de vários stakeholders, incluindo entidades governamentais, academias, empresas tecnológicas e associações de doentes. “A palavra comum nas respostas foi ‘medo'”, algo que divide em três pilares: “o medo dos potenciais efeitos negativos, o medo fruto da falta de compreensão da tecnologia e o medo de não saber lidar com a tecnologia e inovação”.

Sem deixar de admitir que existem, principalmente a nível legislativo, muitos desafios no que toca à inteligência artificial, garante que o “potencial positivo tem de ser libertado para, nos vários setores, traduzir-se em melhores resultados para cada área da economia e, no caso da saúde, em melhores resultados de saúde para os cidadãos e sistemas de saúde”.


Frisou que perante este contexto a União Europeia “quis assumir alguma liderança à escala global e tentar criar um framework que tem como base uma avaliação de risco das tecnologias de IA mediante a sua aplicação, sendo que naturalmente há setores altamente sensíveis e considerados de alto risco”, como a saúde e o contacto direto com os cidadãos. Referiu que a “maior fragilidade aconteceu no processo legislativo no Parlamento Europeu, em que os Modelos de Linguagem de Grande de Dimensão, como é o caso do ChatGPT, eram considerados de baixo risco, até o ChatGPT ser apresentado publicamente a meio do processo”. “Nesse momento os legisladores mudaram para alto risco. Não sabemos para onde vai a tecnologia, ninguém sabe e quem disser que sabe está a mentir. O que é agora de baixo risco, eventualmente será de alto risco no futuro, podendo ainda surgir aplicações associadas à IA que nem sequer estão contemplados nesta avaliação”, acrescentou.

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Mas, “o diabo está sempre nos detalhes” e tudo depende da aplicação do regulamento a nível nacional, com os países a terem dois anos para adotar o AI Act. “Os países têm agora de garantir que a aplicação é feita com o apoio e contexto das leis de cada país, garantindo serem capazes de entender a tecnologia e a aplicar o conjunto de regras e standards internacionais. O objetivo é promover a utilização responsável destas tecnologias e para não existirem barreiras à inovação”, disse.

Perante esta opinião, fez sentido questionar Ricardo Baptista Leite sobre a necessidade de a lei não ser estanque, até porque no período de dois anos podem acontecer inúmeras inovações. Dizendo que “o framework está sempre a evoluir”, afirmou ainda: “Este é um dos maiores desafios de legislar na área tecnológica. Fui deputado na Assembleia da República durante quatro mandatos e posso dizer que a velocidade da tecnologia é mais rápida do que a legislativa. Continuamos a cometer o erro de fazer legislação na esperança de acompanhar a inovação”.

Partindo da experiência enquanto CEO da HealthAI e presidente da UNITE fala que se vive neste tema uma “realidade universal”. Assim, recomenda que exista uma “legislação leve, que delegue nas entidades reguladoras a verdadeira competência”. “As entidades reguladoras têm de ter profissionais e tecnologia capazes de aplicar as regras nesse contexto e poderem ter o investimento necessário. O pior que nos podia acontecer era a humanidade ter desenvolvido um conjunto de tecnologias que podem ajudar a humanidade, mas depois, por incompetência regulamentar, impedirmos que essas tecnologias sejam colocadas ao serviços das pessoas”, disse. Perante isto, “a delegação a essas entidades significa que não precisam de voltar a votar a cada mudança, confiando em quem tem competências técnicas, havendo a hipótese de criar uma inteligência coletiva que acompanhe a tecnologia”.

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“É preciso que os legisladores e os governantes tenham a coragem de delegar esse poder, porque julgo ser a única forma realista e pragmática de acompanhar a velocidade da tecnologia”, disse ainda.

Aproveitando a experiência enquanto médico, acrescentou que “a inteligência artificial é já usada na saúde, como por exemplo nas tecnologias de imagem, e existem já relatórios preparados por máquinas e depois revistas por profissionais”. Adicionou a isto o impacto que a IA já tem na decisão clínica, bem como o facto de haver “aplicação destas ferramentas em todo o mundo, sobretudo em contextos de baixos rendimentos e com ausência de profissionais de saúde”. “Isto está a acontecer hoje. Não é futurologia”, afirmou. “Pode ainda ajudar em tarefas administrativas e burocráticas, reaproximando os profissionais de saúde, contribuindo para a humanização e retorno de alguma compaixão aos sistemas de saúde”, frisou.

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Sobre o papel da UNITE e a sua rede de parlamentares, destacou que “um dos maiores desafios da atualidade é a contrainformação”. “Quando há quem questiona a ciência ou, por exemplo, o poder de prevenção de doenças que uma vacina certificada proporciona, torna-se impossível termos uma conversa séria sobre o que quer que seja”, disse. Destacando que os mais de 300 membros da UNITE tanto partilham contextos, para benefício mútuo, como são atores de uma ligação a associações de doentes ou organizações científicas, garantindo que a informação chegue “a quem está disponível a ter uma conversa séria sobre a matéria”. Admitiu que “muitas vezes há confrontos de ideias, até confrontos culturais, existindo ainda um sentimento entre os países de baixos rendimentos, na África Subsariana e na América Latina, de que o norte global quer sempre impor a sua vontade”. “É necessário construir estas pontes e ultrapassar barreiras, muitas vezes culturais, mas já estamos a dar um passo em frente se colocarmos as pessoas a conversar”, garantido.

A finalizar a entrevista, mas sem levantar o pano, falou sobre a sua intervenção no Rethinking Pharma, dizendo que o seu “contributo tentará trazer um pouco daquilo que é a inteligência artificial aplicada à saúde e o seu potencial a maximizar”. “Olhar ainda para o futuro, como é que os estados e os sistemas de saúde se vão organizar, pelo menos com base na nossa experiência e na visão da Health AI. E nesse contexto também vou abordar um pouco como é que eu acho que a inteligência artificial pode ajudar a transformação dos próprios sistemas de saúde, incluindo o português”, referiu.

“É preciso ter uma mente aberta para não só aplicar a tecnologia ao modo atual de funcionar, mas perceber o potencial que a tecnologia nos dá, levar-nos a sonhar um pouco mais alto e a pensar como é que o sistema de saúde pode ser. Uma visão em que nós garantimos um sistema de saúde que promova a saúde, em vez de apenas reagir à doença. Um sistema de saúde que melhore o bem-estar, em vez de apenas tratar das pessoas quando estão doentes, é um futuro que eu acho que é possível. Está ao nosso alcance a  tecnologia pode ajudar. Vou levantar um pouco o véu no Rethinking Pharma sobre pelo menos a minha visão de como podemos lá chegar”, finalizou.

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