SNS em discussão na próxima campanha eleitoral 560

Os problemas do SNS vêm já há algum tempo a ser discutidos no espaço público, atingindo uma espécie de clímax no final de outubro 2023, com o diretor executivo do SNS a avisar que o mês que se seguia poderia ser o mês mais negro dos 44 anos de história do SNS.1 De facto, as estatísticas não são muito favoráveis e associam o SNS a uma fraca proteção financeira dos seus utentes.2

Com as eleições já aí, é de esperar que o SNS se torne central nos debates eleitorais. Estou curioso para ver que estratégias os partidos vão implementar e que propostas vão produzir, mas para já, enquanto esperamos, vou apenar resumir de um ponto de vista mais teórico que tipo de argumentos espero.

Muitos partidos vão propor um aumento do orçamento para o SNS (talvez o caminho mais fácil?). À partida, mais dinheiro no SNS deverá implicar melhores serviços para a população. No entanto há aqui uma pergunta fundamental que precisa ser feita: Qual é o custo de oportunidade? Cada vez que se propõe aumentar os gastos num sítio, sem que a riqueza cresça, é necessário diminuir gastos noutro sítio. Os partidos têm de se esforçar por responder exatamente como é que que vão financiar as suas propostas, explicando não só os esperados ganhos reais que preveem para o sector da saúde, como também as perdas que preveem para os setores que vejam os seus recursos serem reduzidos. A título de exemplo, se um governo decidisse tirar dinheiro da educação para colocar na saúde, seria preciso justificar muito bem que os ganhos marginais na saúde, fruto dessa transferência, seriam maiores que as perdas de bem-estar causadas pelo desinvestimento em educação. Claro que isto não é um exercício fácil, porque envolve medir muitos efeitos, que não se limitam aos respetivos mercados, mas ainda assim é exigível que os partidos apresentem no mínimo uma lógica sólida para as suas expectativas.

É possível, no entanto, que os partidos não proponham uma “redistribuição das fatias do bolo”. Em vez disso, podem propor cozinhar um bolo maior. Este é o argumento do crescimento económico. Se Portugal conseguir crescer economicamente, pode-se aumentar os recursos do SNS simplesmente porque a base tributária aumenta e o estado fica com mais dinheiro para gastar no que lhe apetecer. Novamente, a coisa fica um pouco abstrata por ninguém saber exatamente qual é a fórmula do Danoninho que faz crescer economias. Logo, podemos apenas estar atentos às contas feitas pelos partidos. Podemos tentar entender se serão minimamente credíveis, e caso o sejam, se o crescimento económico esperado será suficiente para canalizar a quantidade (e qualidade) de novos recursos que o SNS precisa para resolver os seus problemas mais prementes. Mais, mesmo uma excelente estratégia para fazer crescer o país pode demorar tempo a gerar frutos. Logo, importa saber sobre o horizonte temporal e que medidas vão ser tomadas para amenizar a situação até que os frutos estejam prontos a ser colhidos.

Um caminho alternativo, que não envolva mais dinheiro a entrar no SNS, é o caminho da eficiência. Embora me pareça que os argumentos anteriores são mais fáceis de esgrimir num debate político, a verdade é que aprender a fazer mais com o mesmo, ou o mesmo com menos, ou mais com menos, terá sempre de estar no horizonte do decisor político. Por este motivo deveremos estar atentos a possíveis propostas de alterações de sistemas organizacionais que sejam passiveis de promover um aumento de produtividade no setor, realocações de recursos dentro do SNS (de subsectores menos produtivos para setores mais produtivos), a alterações de incentivos que possam melhor alinhar os objetivos dos profissionais de saúde com os objetivos do estado, e a reduções de potenciais custos identificados como supérfluos.

Dada a complexidade de encontrar métodos para melhorar a eficiência, espera-se que os partidos políticos recorram à ciência, e, sempre que possível baseiem as suas propostas em teoria económica e evidência empírica.

Por fim, não basta olhar ao SNS como único sector de intervenção. O mercado de saúde é extremamente complexo, podendo influenciar e ser influenciado por outros mercados. Neste sentido, medidas que melhorem outros mercados podem também elas afetar positivamente a saúde dos Portugueses. Voltando a usar a educação como exemplo, a teoria económica determina que indivíduos com maiores níveis de educação são mais produtivos no seu consumo de saúde e protegem o seu bem-estar com mais eficiência que indivíduos com menores níveis de educação3,4. Logo, é esperado que apostas na educação, prevenção, maior rendimento, etc…, possam ajudar a aliviar o SNS.

É a estas linhas que vou estar atento na próxima campanha eleitoral. Idealmente, espero que todos os partidos organizem os seus debates para contemplarem discussões de todos elas.

 

1             TSF Rádio Notícias. ″Se nada se alterar, novembro vai ser o pior mês de sempre nestes 44 anos do SNS″. TSF Rádio Notícias. 2023; published online Oct 24. https://www.tsf.pt/portugal/sociedade/se-nada-se-alterar-novembro-vai-ser-o-pior-mes-de-sempre-nestes-44-anos-do-sns-17220157.html (accessed Dec 29, 2023).

2             World Health Organization. UHC watch. 2023. https://apps.who.int/dhis2/uhcwatch/#/ (accessed Dec 29, 2023).

3             Grossman M. Chapter 7 The human capital model. In: Handbook of Health Economics. Elsevier, 2000: 347–408.

4             Grossman M. Chapter 10 Education and Nonmarket Outcomes. In: Handbook of the Economics of Education. Elsevier, 2006: 577–633.

Luís Coelho Filipe, Lecturer na Lancaster University, Reino Unido.

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