
Durante o gozo da licença de parentalidade, pensei em como os dias estavam cada vez maiores e como era bom saborear a primavera e o início do calor. Que bom é poder aproveitar uma licença durante o verão!
Ao mesmo tempo que considerei este aspeto positivo, surgiu-me a questão: terá uma mulher cujo filho nasceu no inverno a mesma energia? O que é que a combinação de dias curtos e noites (ainda mais) longas a acompanhar a privação de sono associada à alimentação de um recém- nascido faz à saúde mental da mulher?
Eis a minha questão principal: Estarão as mulheres cujos bebés nasceram nos meses de outono e inverno em maior risco de vir a sofrer uma depressão pós-parto? Afinal de contas, já dizia Rui Veloso que “a primavera da vida é bonita de viver, tão depressa o sol brilha como a seguir está a chover”…
Considero uma ideia interessante para um estudo, embora rapidamente percebesse a inexistência de dados e consequentemente evidência para Portugal.
Comecemos, por isso, pelo início: o que é a depressão pós-parto? Diferente dos chamados “baby blues”, cuja natureza é transitória, a depressão pós-parto é mais severa, caracterizando-se por sinais prolongados de tristeza, perda de interesse em atividades diárias, ansiedade, irritabilidade, assim como em dificuldades em estabelecer vínculo com o bebé1,2.
A depressão pós-parto é um transtorno de humor prevalente e potencialmente grave que afeta entre 10 a 15% das mães, e pode surgir um pouco antes do parto e/ou durante todo o primeiro ano após o parto. Contudo, é mais frequente o seu início até 4 meses após o parto2. Esta depressão resulta de uma combinação de alterações hormonais, predisposição genética e fatores ambientais; no entanto, até 50% dos casos permanecem não diagnosticados devido ao estigma associado à condição e à relutância das pacientes em revelar os sintomas1.
O reconhecimento e tratamento eficazes desta condição são essenciais para otimizar os resultados de saúde tanto da mãe quanto do bebé.
O que se sabe sobre a o efeito da sazonalidade na depressão pós-parto (DPP)?
- A ocorrência de depressão pós-parto tende a ser mais expressiva no outono e durante o período mais escuro do ano imediatamente após o parto, e menor na primavera3,4.
- Evidência mais detalhada sugere que mulheres cujos bebés nasceram nos últimos três meses do ano apresentaram um risco significativamente maior de sintomas depressivos autorrelatados tanto às 6 semanas quanto aos 6 meses após o parto comparativamente a mulheres cujos bebés nasceram entre abril e junho5.
- O mecanismo sazonal subjacente à DPP ainda não é claro na literatura. No entanto, a evidência indica que a menor duração da luz solar poderá ser um dos elementos mais evidentes para uma possível explicação. Sabe-se que a variação dos níveis hormonais desempenha um papel fundamental na depressão, variando conforme a estação e a exposição à luz, nomeadamente no que toca ao impacto da luz no bom funcionamento do ritmo circadiano e nos níveis de melatonina. Da mesma forma, uma menor exposição a luz diurna poderá reduzir as atividades ao ar livre promovendo o aumento no potencial de captação de serotonina, o que pode estar relacionado com o humor depressivo4.
Na impossibilidade de apresentar informações que, além do estudo da fundação fisiológica para este fenómeno e dos resultados conhecidos noutras geografias, permitam caracterizar melhor o contexto português, fica desde já uma sugestão sobre como começar: pelo acompanhamento das mulheres após o parto. Estes dados devem ser recolhidos durante um determinado período de tempo, podendo, por exemplo, ser utilizada a Escala de Depressão Pós-Parto de Edimburgo (Edinburgh Postanatal Depression Scale – EDPS) 3,5,6.
Mais ainda, e considerando que o acompanhamento da mulher na fase da gravidez, e especialmente no pós-parto, poderá não incidir sobre a sua saúde mental, penso que será importante garantir que é prestada a adequada atenção a este aspeto no acompanhamento da mãe neste período de gravidez e puerpério. Um investimento que vale a pena fazer, não apenas para assegurar a saúde mental da mãe mas, também, para garantir o crescimento e desenvolvimento seguros da criança, simultaneamente promovendo um maior conhecimento sobre a evolução da saúde mental neste período, inclusive o impacto das estações do ano na sua potenciação ou mitigação.
Joana Gomes da Costa
Investigadora do NOVA Health Economics and Management Knowledge Centre
Referências
- Carlson, , Mughal, S., Azhar, Y., & Siddiqui, W. (2024). Postpartum depression. In StatPearls [Internet]. StatPearls Publishing.
- (2023, 8 de março). Depressão Pós-Parto. https://www.sns24.gov.pt/pt/tema/saude-da-mulher/depressao-pos-parto/
- Hiltunen, P., Jokelainen, J., Ebeling, H., Szajnberg, N., & Moilanen, I. (2004). Seasonal variation in postnatal depression. Journal of affective disorders, 78(2), 111-118.
- Tung TH, Jiesisibieke D, Xu Q, Chuang YC, Jiesisibieke Relationship between seasons and postpartum depression: A systematic review and meta-analysis of cohort studies. Brain Behav. 2022 Jun;12(6):e2583. doi: 10.1002/brb3.2583. Epub 2022 May 3. PMID: 35502646; PMCID: PMC9226811.
- Sylvén, M., Papadopoulos, F. C., Olovsson, M., Ekselius, L., Poromaa, I. S., & Skalkidou,
- (2011). Seasonality patterns in postpartum depression. American journal of obstetrics and gynecology, 204(5), 413-e1.
- (n.d.). Edinburgh Postnatal Depression Scale. Obtido em 20 de junho de 2025, de https://www.sciencedirect.com/topics/nursing-and-health- professions/edinburgh-postnatal-depression-scale