Medicamentos biossimilares: potencial de poupança no SNS 3373

Os medicamentos biológicos são medicamentos que têm substâncias ativas com origem em células, organismos vivos ou outras fontes biológicas e são amplamente usados no tratamento de doenças crónicas. Um biossimilar é um medicamento muito semelhante ao biológico de referência previamente existente, sem diferenças significativas em termos clínicos de segurança e eficácia. 1,2 Os dois tipos de medicamentos são substitutos, no sentido em que um biossimilar pode ser usado em vez de um biológico e o seu contrário.3  Contudo, trocas pelos médicos prescritores e a substituições na dispensa ao nível da farmácia obedecem a regras, que podem variar entre os países. No caso português, o médico prescritor pode trocar de um biológico para um biossimilar, desde que seja garantido o controlo e registo por parte da farmácia hospitalar, e não é permitida a substituição automática pela farmácia, sem consentimento do prescritor. 4

Na União Europeia, a última década (2014-2024) foi marcada por um aumento da despesa farmacológica com medicamentos biológicos e biossimilares, a um ritmo consideravelmente superior ao verificado nos outros medicamentos. Enquanto a despesa com biológicos cresceu a uma taxa média anual de 10%, os biossimilares registaram um crescimento anual de 4%. Em 2024, os biológicos representaram cerca de 37% da despesa total com medicamentos (95 mil milhões de euros), enquanto os biossimilares representavam apenas 4% da despesa (10 mil milhões de euros).

A introdução dos biossimilares visa, entre outros objetivos, reduzir os custos associados aos tratamentos e aumentar o acesso. Em Portugal, a política de preços estabelece reduções obrigatórias para os biossimilares que pretendam entrar no mercado. Um biossimilar deve ter um preço de pelo menos 80% do preço do biológico de referência. Contudo, o preço deverá ser igual ou inferior a 70%, se já existirem outros medicamentos biossimilares financiados com pelo menos 5% de quota de mercado.5 A introdução do primeiro biossimilar no Serviço Nacional de Saúde (SNS) ocorreu em 2008, estando atualmente financiados 18 medicamentos: 14 de exclusivo uso em meio hospitalar, 3 em meio de ambulatório e 1 para ambos.

Embora a política de preços estabeleça reduções obrigatórias para os biossimilares que pretendam entrar no mercado, a verdadeira dimensão das poupanças depende não apenas do preço inicial, mas da penetração efetiva desses medicamentos. Em Portugal, um estudo de Perelman et al. analisou a adoção de biossimilares no SNS, entre 2015 e 2021. Os resultados revelaram uma adoção heterogénea dos biossimilares entre os hospitais analisados, variando de 0% a 100%, consoante a molécula e o hospital. Os hospitais académicos apresentaram um tempo de adoção relativamente mais rápida e a participação em ensaios clínicos esteve associada a uma maior quota de biossimilares. Com os dados para o período em análise, os autores estimaram que, se todos os hospitais tivessem quotas semelhantes aos de topo na adoção de biossimilares, as poupanças anuais para o SNS poderiam atingir os 13,9 milhões de euros.6 Contudo, se considerarmos o potencial de adoção em todas as moléculas atualmente disponíveis, o valor estimado poderia ser ainda superior.

Dados mais recentes do INFARMED indicam que cerca de 82% das substâncias ativas de medicamentos biológicos em meio hospitalar em 2024 já correspondiam a biossimilares, um aumento face aos anos anteriores. Estima-se que o SNS tenha poupado cerca de 145 milhões de euros com o uso de biossimilares em 2023, valor estimado através da valorização do número de unidades consumidas, de 5 substâncias ativas cuja adoção está estabilizada, pelo custo médio unitário reportado em 2018. 5

Com o fim de várias patentes em vista até 2027, existe potencial para o aparecimento de novos biossimilares que poderão contribuir para intensificar a concorrência. 7  Desta forma, e face ao potencial comprovado de redução de custos, é indispensável a aposta nestes medicamentos e a sua expansão, através de medidas e estratégias que promovam e incentivem a sua utilização, salvaguardando o acesso equitativo a todos os utentes.

Francisco Madeira e Joana Alves

Escola Nacional de Saúde Pública

Universidade NOVA de Lisboa

 

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Referências:

  1. Comissão Europeia. O que preciso saber sobre medicamentos biossimilares: Informação para doentes. https://www.infarmed.pt/documents/15786/1410451/O+que+preciso+saber+sobre+medicamentos+biossimilares/4c384240-ee3e-4978-889d-b1b47b31ffe1 (2016).
  2. Agência Europeia de Medicamentos & Comissão Europeia. Medicamentos biossimilares na UE: Guia informativo para profissionais de saúde. https://www.ema.europa.eu/pt/documents/leaflet/biosimilars-eu-information-guide-healthcare-professionals_pt.pdf (2019).
  3. European Medicines Agency (EMA). Biosimilar medicines can be interchanged. https://www.ema.europa.eu/en/news/biosimilar-medicines-can-be-interchanged (2022).
  4. Comissão Nacional de Farmácia e Terapêutica. INFARMED. Medicamentos Biossimilares Informação para doente. http://www.infarmed.pt/web/infarmed/submissaoram (2018).
  5. Direção de Informação e Planeamento Estratégico. INFARMED. Medicamentos biossimilares: experiência portuguesa. https://www.infarmed.pt/documents/15786/2219894/Medicamentos+biossimilares/22647221-1a4d-f8d3-4e8e-39cd1e6cf767#page=18.12 (2024).
  6. Perelman, J. et al. How do hospital characteristics and ties relate to the uptake of second-generation biosimilars? A longitudinal analysis of Portuguese NHS hospitals, 2015–2021. Expert Rev Pharmacoecon Outcomes Res 23, 99–109 (2023).
  7. IQVIA, Durand-Zaleski, I. & Thomas, T. Incentives for using biosimilars in France and Europe: analysis, assessment, and perspectives. https://www.iqvia.com/-/media/iqvia/pdfs/france/white-paper/incentives-for-using-biosimilars-in-france-and-europe.pdf#page=25.07 (2023).