O Parlamento aprovou, em 24 de janeiro, o projeto de resolução apresentado pelo PAN para criação de um projeto piloto de intervenções terapêuticas em situações clínicas ligeiras por farmacêuticos nas farmácias comunitárias.
O projeto de resolução n.º 539/XVI/1.ª recomenda ao Governo que, “mediante prévia articulação com a Direcção-Geral de Saúde, a Direção Executiva do Serviço Nacional de Saúde (SNS), as Ordens profissionais e organizações representativas dos profissionais de saúde, dos farmacêuticos e das farmácias comunitárias, crie um projeto-piloto que permita às farmácias comunitárias fazer, de acordo com protocolos clínicos específicos e pré-determinados, o atendimento de situações clínicas ligeiras e não-urgentes, como infeções urinárias, sinusites, dores de garganta ou otites médias, com prescrição do tratamento adequado ou encaminhamento, quando justificado, para os cuidados de saúde primários”.
Ao NETFARMA, Ema Paulino, presidente da Associação Nacional das Farmácias (ANF), refere que “a ANF vê a aprovação da criação de um projeto-piloto que permita às farmácias comunitárias fazer o atendimento de situações clínicas ligeiras e não urgentes como um reconhecimento do papel do setor no sistema de saúde, assim como um passo importante e decisivo para a sua implementação efetiva, normalizando e protocolando o atendimento em situações que podem ser resolvidas pelo farmacêutico comunitário, e acerca das quais as pessoas já procuram com frequência aconselhamento na farmácia”.
Segundo a dirigente, “acreditamos que este programa tem o potencial de melhorar o acesso aos cuidados de saúde, promovendo, por um lado, a utilização racional dos recursos existentes e a eficiência, efetividade, qualidade e otimização dos mesmos, e aliviando, por outro, a pressão sobre os cuidados primários e os serviços de urgência. Esta é, aliás, uma medida que a ANF tem vindo a propor aos partidos desde o início da legislatura”.
Foi com este propósito, aliás, que, em 2024, a ANF disponibilizou uma ferramenta de registo destas intervenções pelas farmácias portuguesas, “tendo-se verificado ao longo deste primeiro ano mais de 174 mil registos, num total de 1800 farmácias em todo o território nacional, incluindo as regiões autónomas”, revela Ema Paulino, acrescentando que “estas intervenções abrangeram diversas condições, destacando-se como mais frequentes a constipação, a tosse, a dor musculoesquelética, a infeção do trato urinário (ITU) e a infeção aguda da orofaringe (IAO)”.
Graças às intervenções realizadas, ainda segundo a farmacêutica, “167 334 casos não resultaram em encaminhamento para consulta médica, correspondendo a 96% do total. Estes dados condizem, inclusive, com experiências internacionais, nomeadamente no País de Gales, que evidenciam a redução do recurso aos serviços de saúde e ainda um uso mais racional dos antibióticos”.
Implementação de um programa estruturado
O objetivo do projeto piloto é, assim, “a implementação de um programa estruturado a nível nacional que, através de protocolos estabelecidos com a Ordem dos Farmacêuticos e a Ordem dos Médicos, permite a resolução nas farmácias de situações consideradas ligeiras (situações de patologia aguda simples) e a identificação e referenciação precoce de situações que exigem outros níveis de cuidados de saúde e de avaliação por profissionais médicos”.
A este respeito, Ema Paulino cita o estudo recente ‘O papel da Farmácia Comunitária na Jornada do Doente’, realizado pela IQVIA, que revelou que “99% dos utentes concorda que, ‘com um papel mais ativo por parte das farmácias, o SNS poderá ficar menos sobrecarregado, gastando menos e conseguindo, desta forma, financiar os serviços prestados na farmácia’. O estudo revela ainda que a intervenção farmacêutica em situações ligeiras e a referenciação de doentes para o médico ou outros serviços de saúde foi dos contributos mais significativos das farmácias apontados tanto por médicos de Medicina Geral e Familiar como por farmacêuticos”.
Capacitar os farmacêuticos
A ANF tem vindo, por isso, “a investir fortemente na capacitação contínua dos farmacêuticos comunitários, considerando que a formação adequada é um pilar fundamental para garantir que os profissionais estão bem preparados para intervir nas situações clínicas ligeiras de forma eficaz e em conformidade com as melhores práticas”.
Deste modo, como explica a presidente da ANF, “desde o final do ano 2023 que as equipas das farmácias têm vindo a completar um percurso formativo específico, que já permitiu capacitar os farmacêuticos que registaram as intervenções mencionadas anteriormente, e que explora esta intervenção em 21 situações clínicas ligeiras distintas”.
Mecanismos de comunicação
Por fim, Ema Paulino ressalva que “consideramos ser fundamental a criação de mecanismos de comunicação que permitam assegurar uma referenciação adequada dos casos não passíveis de resolução na farmácia e garantir a continuidade dos cuidados de saúde”.
A ANF continuará a acompanhar de perto este processo, “reforçando a disponibilidade das farmácias comunitárias para a implementação deste programa, em conjunto com as restantes entidades de saúde”, conclui a responsável.