Em cenários de emergência ou catástrofe, a capacidade de resposta rápida e coordenada é essencial para proteger vidas e garantir a continuidade dos cuidados de saúde. As farmácias comunitárias, pela sua proximidade à população e capilaridade territorial, podem desempenhar um papel determinante nestes contextos. Mas estarão preparadas para assumir essa responsabilidade?
Ao NETFARMA, João Roseiro, tenente-coronel farmacêutico e coordenador do Grupo Profissional de Farmácia Militar e de Emergência da Ordem dos Farmacêuticos (OF), deixa alguns conselhos às farmácias comunitárias para se prepararem para estas situações e explica como podem colaborar com as autoridades de proteção civil e de saúde pública.
– Acha que as farmácias comunitárias estão preparadas para atuar nesse tipo de contexto? Porquê?
– De forma geral, as farmácias comunitárias ainda não estão totalmente preparadas para atuar em contextos de emergência ou catástrofe. Falta-lhes, muitas vezes, formação específica e protocolos formais que orientem a resposta nestas situações. No entanto, é inegável o papel essencial que desempenham: pela sua proximidade à população, capilaridade territorial e nível de confiança que mantêm com a comunidade, as farmácias podem ser o primeiro ponto de contacto em momentos de crise. Mesmo sem formação especializada, as equipas farmacêuticas têm condições para prestar informação fidedigna, acalmar e orientar a população e assegurar a continuidade das terapêuticas crónicas. Em suma, podem ser um contributo fundamental quando o sistema de saúde é posto à prova.
– Existem protocolos definidos (locais ou nacionais) que as farmácias comunitárias possam seguir?
– Atualmente, não existe um quadro legal nacional que regule de forma específica a atuação das farmácias em situações de emergência. O que existe é uma colaboração informal, sobretudo a nível local, com as autarquias e os serviços de saúde. Essa relação de proximidade tem permitido desenvolver algumas respostas pontuais, mas falta ainda um enquadramento estruturado.
– Que conselhos deixar às farmácias comunitárias para se prepararem para estas situações?
– O primeiro passo é planear. Cada farmácia deve elaborar o seu próprio plano interno de emergência, com contactos atualizados da Proteção Civil e das entidades de saúde. É importante definir quem faz o quê dentro da equipa, garantir que todos sabem como agir e manter um stock mínimo estratégico de medicamentos e material de primeiros socorros. A formação também é essencial, tanto em primeiros socorros como em comunicação em crise. E, acima de tudo, deve existir uma ligação permanente com as estruturas locais de emergência, participando em simulacros e ações conjuntas. Pequenas medidas podem fazer uma enorme diferença na capacidade de resposta.
– Se tivesse de estabelecer três regras básicas para as farmácias nestes contextos, quais seriam?
Em primeiro lugar, manter a calma e agir dentro das competências profissionais. Em segundo, assegurar a continuidade dos cuidados e das terapêuticas, garantindo que ninguém fica sem a sua medicação essencial. E, por fim, cooperar com as autoridades locais e de saúde pública, porque só uma resposta coordenada pode ser verdadeiramente eficaz.
– Como pode a farmácia colaborar com as autoridades de proteção civil e de saúde pública?
– A colaboração deve ser próxima e contínua. A farmácia pode funcionar como um elo de comunicação entre as autoridades e a comunidade, ajudando a transmitir informação credível e combater a desinformação. Pode ainda participar na distribuição de medicamentos e kits de emergência, apoiar o rastreio de necessidades da população e integrar redes locais de resposta. Quando a comunicação flui, a resposta é mais rápida e eficaz e a comunidade sente-se mais protegida.
– Que mensagem deixa às equipas de farmácia comunitária que se sentem despreparadas para agir em situações-limite?
– A preparação não exige heroísmo. Exige consciência, treino e coordenação. Mesmo sem formação específica, as equipas farmacêuticas podem desempenhar um papel fundamental nestes contextos: ouvir, orientar, acalmar e assegurar a continuidade dos cuidados. O importante é reconhecer a responsabilidade que têm enquanto estruturas de saúde de proximidade e agir com serenidade, organização e espírito de missão. A comunidade confia na farmácia e essa confiança é, em si, uma força.
– Que passos práticos cada farmácia pode dar já hoje para estar mais preparada?
– Os farmacêuticos podem desempenhar um papel preventivo, promovendo a literacia em saúde e sensibilizando a população para medidas básicas de autoproteção. Mas há ainda outras ações que podem ser feitas no imediato, por exemplo, estabelecer contacto com a proteção civil local, mas também criar e testar um plano interno de emergência, rever stocks e garantir a disponibilidade de medicamentos essenciais, ou investir em formação específica. Neste contexto, é importante referir que a Ordem dos Farmacêuticos, através do Grupo Profissional de Farmácia Militar e Emergência, vai promover em maio de 2026 a segunda edição do Curso de Intervenção Farmacêutica em Emergência e Catástrofe, que visa preparar as equipas para responder com maior segurança, eficácia e coordenação, fortalecendo o papel dos farmacêuticos como estrutura de proximidade e apoio em contextos de crise.




