Ensino Farmacêutico em Transformação: APEF apresenta documento estratégico para o futuro 5038

A Associação Portuguesa de Estudantes de Farmácia (APEF) realizou, no passado sábado, o Fórum do Ensino Farmacêutico, no Salão Nobre da Sede Nacional da Ordem dos Farmacêuticos, em Lisboa. Durante o evento foi lançado oficialmente o ‘Livro Branco do Ensino Farmacêutico’, um documento estratégico e colaborativo elaborado a partir do esforço conjunto de estudantes, docentes, profissionais e entidades institucionais.

Em entrevista ao NETFARMA, Afonso Garcia sublinha que “a criação do ‘Livro Branco do Ensino Farmacêutico’ surge da necessidade de consolidar e compilar a visão estratégica da Associação Portuguesa de Estudantes de Farmácia para o ensino farmacêutico. Após cinco anos de estudos e análises promovidas pela APEF, tornou-se evidente a importância de reunir num único documento todas as propostas, prioridades e caminhos estratégicos identificados”.

Este livro branco – que nasce também “de um processo profundamente participado, envolvendo instituições de ensino superior, estudantes, docentes e parceiros do setor” – tem como objetivo “disponibilizar um documento forte, coerente e amplamente consensual, capaz de orientar a evolução do ensino farmacêutico em Portugal nos próximos anos”, acrescenta o responsável.

Livro Branco capítulo a capítulo

Afonso Garcia destaca agora, por capítulo, as principais propostas:

Capítulo: Boas Práticas Pedagógicas e Curriculares

“O ensino farmacêutico atravessa um período de transformação profunda, exigindo modelos pedagógicos que coloquem o estudante no centro da aprendizagem. A comunicação, o trabalho interpessoal, a multidisciplinaridade, o pensamento crítico e o raciocínio científico tornaram-se competências essenciais para o farmacêutico moderno.
Assim, incluir um capítulo dedicado às boas práticas pedagógicas e curriculares é fundamental para reforçar métodos de ensino inovadores, promover ambientes de aprendizagem mais eficazes e garantir que os programas formativos acompanham as necessidades atuais da profissão.”

A proposta: “Incluir a inovação pedagógica como critério nos processos de avaliação e progressão dos docentes, reconhecendo e premiando projetos inovadores que promovam um ensino mais eficaz.

Atualmente, os processos de progressão académica continuam a valorizar quase exclusivamente a produção científica, deixando para segundo plano a criatividade, a qualidade do ensino e o esforço dedicado ao desenvolvimento pedagógico.

Integrar a inovação pedagógica como critério explícito e específico nestes processos é, por isso, essencial para reconhecer formalmente o trabalho dos docentes que investem na melhoria das práticas educativas.

Esta medida é estratégica porque viabiliza todas as restantes, ao permitir que os docentes tenham espaço para inovar, abre caminho à melhoria contínua do ensino, à adoção de metodologias mais ativas e à integração adequada de novas tecnologias.”

Capítulo: Avaliação e Melhoria Contínua da Aprendizagem

“A avaliação no ensino superior permanece muitas vezes dependente de um único exame final, o que não valoriza o esforço e a evolução progressiva dos estudantes ao longo do semestre.
É essencial promover modelos de avaliação mais contínuos e transparentes, capazes de apoiar o desenvolvimento académico de forma mais justa e eficaz. Este capítulo pretende assumir a avaliação como parte integrada do processo de aprendizagem e não apenas como um momento final.”

A proposta: “Fornecimento regular de feedback estruturado e construtivo aos estudantes.
O feedback contínuo permite identificar pontos fortes e áreas de melhoria, orientando a autorregulação e favorecendo progressões académicas mais adaptadas e contínuas.
Além disso, ajuda a prevenir lacunas de conhecimento, promove a transparência do processo de avaliação e reforça a aprendizagem ativa, pilares essenciais para um ensino farmacêutico mais moderno e eficaz.”

Capítulo: Inovação Pedagógica e Tecnológica

“Vivemos numa era em que a inteligência artificial e outras tecnologias emergentes já fazem parte do quotidiano dos estudantes e docentes. O ensino farmacêutico não pode ignorar esta realidade.
É indispensável incorporar estas ferramentas de forma estratégica, ética e regulada, garantindo que potenciam a aprendizagem sem comprometer a integridade académica ou a identidade da profissão. Este capítulo responde à necessidade de orientar o uso responsável da tecnologia e de preparar os futuros farmacêuticos para um ambiente profissional cada vez mais digitalizado.”

A proposta: “Estabelecer políticas claras e éticas sobre o uso de tecnologias e IA no ensino, promovendo transparência, autonomia, pensamento crítico e criatividade.
Com a rápida integração da IA na saúde, torna-se fundamental definir orientações que previnam riscos, assegurem boas práticas e capacitem os estudantes para utilizar estas ferramentas de forma responsável e humanizada.
Mais do que limitar, estas políticas permitem que a IA seja incorporada como um recurso pedagógico valioso, alinhado com os valores e responsabilidades da profissão farmacêutica.”

Capítulo: Vivência em Comunidade Académica

“O sucesso académico não depende apenas dos conteúdos curriculares, a experiência vivida no ambiente académico tem um impacto direto no bem-estar, integração e motivação dos estudantes.
Promover uma vivência universitária saudável, inclusiva e equilibrada contribui para melhores resultados, menor abandono, maior satisfação e formação de profissionais mais completos.
Este capítulo aborda medidas que reforçam o apoio ao estudante, a integração nas instituições e o fortalecimento de comunidades académicas fortes e dinâmicas.”

A proposta: “Implementação de programas institucionais de apoio psicológico gratuitos, confidenciais e com acompanhamento contínuo.
Os estudantes de Ciências Farmacêuticas enfrentam elevados níveis de pressão académica e incerteza vocacional, fatores que aumentam o risco de ansiedade, burnout e outras dificuldades emocionais.
Embora iniciativas como o “Cheque Psicólogo” tenham sido um passo positivo, persistem limitações no número de consultas, nos critérios de acesso e na continuidade do acompanhamento, o que reduz a sua eficácia.
Assim, a criação de programas próprios nas instituições de ensino superior constitui uma medida essencial para garantir apoio psicológico adequado, prevenir a deterioração da saúde mental e promover um ambiente académico mais saudável, seguro e resiliente.”

Capítulo: Estágios e Integração Profissional

“Os estágios, curriculares e extracurriculares, são fundamentais para aproximar os estudantes da realidade profissional e permitir que compreendam a diversidade de saídas da área farmacêutica. Através destas experiências práticas, os estudantes ganham maior consciência das competências exigidas pelo mercado, desenvolvem confiança e constroem o seu percurso profissional de forma mais informada.
A inclusão deste capítulo reforça a necessidade de garantir processos de integração progressivos, preparando os futuros farmacêuticos para a sua vida profissional desde os primeiros anos de formação.”

A proposta: “Formalizar a inclusão de estágios extracurriculares no suplemento ao diploma, valorizando oficialmente estas experiências práticas.
Num setor com grande diversidade de carreiras e exigências específicas, as competências adquiridas através de estágios extracurriculares representam uma vantagem competitiva real.
Ao reconhecer institucionalmente estas experiências, os estudantes podem demonstrar proatividade, versatilidade e contacto com diferentes contextos profissionais, atributos cada vez mais valorizados pelos empregadores.
Esta medida reforça a importância da prática na formação farmacêutica e contribui para um futuro percurso profissional mais sólido e diferenciado.”

Livro Branco: Apenas o início

Afonso Garcia chama a atenção que, contudo, O ‘Livro Branco do Ensino Farmacêutico’ “não termina aqui, este é apenas o início de um percurso de transformação”. Assim sendo, explica que “a partir das propostas agora apresentadas, a APEF dará início aos passos necessários para a sua implementação, sempre em estreita colaboração com as instituições de ensino superior, parceiros institucionais e toda a comunidade académica”, sendo que “a participação ativa dos estudantes e dos membros federados da APEF continuará a ser central, garantindo que este processo evolui de forma participada, responsável e alinhada com as necessidades reais da profissão farmacêutica”.